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PERIPÉCIAS DA VIAGEM DA FAMÍLIA REAL - DE PORTUGAL A PRAÇA XV


Imaginem um presidente fugindo para outro país sem aviso prévio, com todos seus ministros, senadores, deputados, membros do judiciário e líderes empresariais. Isso aconteceu em Portugal em 1807.

Na época, D João era príncipe regente, reinando no lugar de sua mãe D Maria I devido problemas mentais. Não tinha sido educado para reinar mas teve que assumir Portugal após a morte de seu irmão. Era casado com Carlota Joaquina, princesa espanhola geniosa e viviam separados em palácios distantes. D João era conhecido por sua indecisão. E em 1807 foi obrigado a tomar a maior decisão de sua vida. Napoleão Bonaparte, que dominava quase toda Europa, ameaçava invadir Portugal caso não o apoiasse no Bloqueio Continental contra a Inglaterra. E Portugal era antigo aliado da Inglaterra.

Portugal possuía uma população pequena, rural e atrasada, Toda economia dependia do que conseguia das colônias, presa ao sistema extrativista e mercantilista. Faltava dinheiro. Tudo que obtinha era dado como pagamento de dívidas com outras países, principalmente a Inglaterra. Continuava sendo rigorosamente católica, religião avessa as idéias revolucionárias da época. Toda vida social era determinada pela Igreja.

Com a ameaça francesa e a dependência econômica da Inglaterra, só havia três opções:

· Ficar em Portugal e lutar contra os franceses com apoio da Inglaterra

· Apoiar a França e ser bombardeada por navios ingleses, que tomariam sua frota e todas suas colônias

· Ou fugir para o Brasil escoltado pelos navios ingleses – opção escolhida

Apesar de ter sido uma grande potência nas Grandes Navegações, Portugal em 1807 estava falido e dependia financeiramente da Inglaterra. Em troca da proteção na viagem, D João prometeu abrir os portos do Brasil ao comércio com as nações estrangeiras amigas, o que significava permitir o comércio direto entre Brasil e Inglaterra. Enquanto fingia aceitar as exigências de Napoleão, as escondidas, D João negociava com os ingleses.

Em novembro de 1807, o porto português estava em alvoroço. Os palácios foram esvaziados, toda prata da Igreja e livros da biblioteca Real foram embalados, todo dinheiro dos cofres portugueses, esvaziados. O povo assistia a tudo sem entender. A explicação dada era que reparos estavam sendo feitos na frota portuguesa. Quando a notícia da partida se espalhou, a indignação foi generalizada.




Em torno de 10000 a 15000 pessoas acompanharam o príncipe regente nessa jornada. Enquanto isso, o exército de Napoleão avançava pela Espanha em direção a Portugal. O desespero na fuga foi tanto que parte das bagagens foram esquecidas, entre ela as pratas da Igreja, que forma derretidas pelos franceses, e os livros da Biblioteca Real, que só chegaram ao Brasil três anos depois. Parte desses livros se encontra na Biblioteca Nacional no Rio de Janeiro.

A esquadra levou 2 meses para atravessar o Oceano Atlântico. Os navios não eram para transporte de massa de passageiros. Os ambientes internos tinham pouca ventilação. Não havia água corrente nem banheiros. A dieta era de biscoito, lentilha, azeite, repolho azedo e carne salgada de porco ou bacalhau. Ratos infestavam os porões, alimentos se contaminavam, passageiros e tripulação adoeciam. Passaram frio durante as tempestades no Hemisfério Norte e forte calor nas calmarias próxima a linha do Equador. A Corte não parava de vomitar. Houve uma infestação de piolhos e as mulheres foram obrigadas a rasparem a cabeça e se desfazerem de suas perucas.

Para piorar a situação, após longa calmaria, ventos fortes passaram a soprar de través e impulsionaram as embarcações em direção contrária exigindo sacrifícios extremos da tripulação para acertar novamente o rumo. Em dezembro, ao se aproximarem do arquipélago das Ilhas Madeiras, uma forte tempestade castigou os navios e dispersou a esquadra. Parte conseguiu seguir a rota programada até Cabo Verde e de lá para o Rio de Janeiro. A parte da esquadra que levava a realeza seguiu em direção a Salvador.

Só em meados de janeiro, a corte chega em Salvador. Não se sabe ao certo se foi pela tempestade ou foi algo planejado. A chegada em Salvador nem era esperada, a comunicação na época era precária na colônia e não havia ninguém para recepcioná-los. Só no dia seguinte foi feita uma cerimônia a altura.

O Príncipe e sua Comitiva passaram um mês em Salvador, em incontáveis festas, celebrações e passeios. Em Salvador, D João assinou a carta régia de Abertura dos Portos e aprovou a criação da primeira Escola de Medicina do Brasil.


Em 26 de fevereiro de 1808, embarcam rumo ao Rio de Janeiro, momento memorável que mudou a história do Brasil. Quando a corte chegou ao Rio de Janeiro, a cidade passava por uma grande explosão demográfica devido a descoberta do ouro e diamantes em Minas Gerais. O tráfico de escravo havia aumentado muito. A população passou de 300 000 a 3 000 000. A maioria era analfabeta, pobre e carente de tudo, a saúde era precária. Havia pouco dinheiro circulante, as negociações locais eram praticamente escambos e o contrabando de metais e pedras preciosas dominavam.


A chegada da Corte Portuguesa foi o encontro de dois mundos estranhos e distantes. De uma lado a Monarquia europeia de casacos, sapatos afivelados, perucas e roupas pesadas. De outro, uma população quase africana formada por negros, mestiços e mulatos semidespidos e descalços compondo 2/3 da população. Poucos brancos circulavam pelas ruas.

D João e seu séquito chegam no Rio de Janeiro, desembarcando onde hoje é a Praça XV. E nesse momento, que o Brasil passa a ser reinventado e muitas das consequentes mudanças estão ainda presentes na nossa cidade.


REFERÊNCIAS

Gomes, Laurentino. 1808- como uma rainha louca, um príncipe medroso e uma corte corrupta enganaram Napoleão e mudaram a História de Portugal e do Brasil. São Paulo. Editora Planeta do Brasil. 2008

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